samedi 30 août 2008

Para a ângela

Douces figues, mots amers

Quand la lampe éclaire la pièce, surgit alors la clairière.
Ceci n'est pas un cri, ceci n'est pas une figue,
ceci n'est pas Antigone...
Dos figos doces escorrem assassinas palavras.
Le fruit est chose, ma nuit, percée d'étoiles,
tous deux se préparent à recueillir l'aveu...
" ...eu o encontrei na noite por acabar ainda
furado pelos bicos das aves de rapina,
no apodrecer que é a alegria do tirano
que te fez nascer "

eduarda dionisio" falas ao amante nao esquecido

lundi 25 août 2008

j'invite la nuit au brouillard




















je subis, le front tendu.

j'invite la nuit au brouillard.
Entre l'aube et le matin,
l'oeil s'ouvre, inquiet et sombre,
surpris.
La douceur courbée de ta nuque
se détache du lin.
Tes mains impairs, cousues de dos
sur le drap,
lâchées.
Le corps boisé et amer, les agrumes
sous la langue,
mes cristaux soulèvent
ce qui te couvre, te protège.

Colombes étourdies au saut du lit,
restez dans ma nuit bavarde,
remuez-moi d'entre les morts,
épuisez l'attente, arrachez-nous
à cette fin de partie.
Piquez mon sein de lait
offert aux gourmands,
dehors le jour appelle
sa lumière.
Si l'homme ne bouge plus,
me dis-je, mon souffle
retiendra dans son effort,
l'éternelle promesse des cruels
assauts affamés, sous la tension
du désir.

LM, août 2008

jeudi 21 août 2008

o caminho dos lobos








Caminhos dos lobos

O pombo corria sem saber onde cair morto.
Torceu o pescoço e ficou quedo,
algo torcido
a cabeça pousada na pedra
parecia um homem cansado de voar,
destroçado por uma longa pena

ou uma doença prolongada.

Desceu à terra, assustou-se e cedeu à mao forte
do destino ou à brusca decisao algo divina.

Passou à arma à esquerda frente
ao n° 100
da rua dos Remédios.
Adormeceu para sempre com a asa levantada
contra a ténue brisa, resistindo, resistindo ,
resistindo.

LM 2006

lundi 18 août 2008

A ultima carta




















( ...) Vivo agora e posso morrer jà,
tanto este mistério me é favoràvel
e se conjuga à desordem que anima o meu sentir.
Nesta hora de exaltaçao pura, nao chamo por ninguém.
Nem por ti, mesmo que saiba onde vives e esperas.
Nao consinto que neste momento de irrealidade,
e profundo amor por tudo o que vive
e me està proximo da mao,
venha a tua dùvida perturbar-me a mente.
Estou nua e viva e nao penso em nada.
Esta brisa é fresca e cortante, a pele enrija
os dentes juntam-se, cerro os punhos,
sei que devo guardar tudo,
mesmo os gestos mais bruscos e doridos.
Muros, ruinas e musgos frescos na sombra.
Ah se fôr hoje o dia da traiçao e do punhal,
saberei dizer à minha carne que nao sou corrupta
como ela.
Estou a inchar de medo neste amor profundo,
como um ventre doente e dorido.
Tenho na pele escrita por dentro o teu nome pintado.
Como a santa limpando o nome do Senhor,
avanças-te o linho
que me era a carne, e por dentro,
por dentro limpaste o rastro frio
do teu coraçao.
Foi como naquela ultima noite em ti,
onde através das tuas palpebras
eu via o teu sonho, e as flores eram o orvalho juntinho
como pérolas e bùzios,
tanta imaginaçao me dava febre
e a tua mao na minha eu nem respirava.
Beijava-te os dedos um a um e recomeçava
contando até mil, para que a noite fosse mais longa.
Punha-me a fechar os olhos e a pedir a Deus
que voltasse ao inicio do mundo para te puder esperar.
Jà é outra vez manha para todos nos, devo-me vestir,
tratar dos que me rodeiam, voltar a ser outra e sem vontade.
Junto a eles rezo coisas sem nexo e o amor é tanto
que o sorriso me acolhe na sua boca oferecida,
encontro toda a leveza do meu pecado.
Lavo neste rio os braços e as maos
que te rodeiam quando neles te enrolas.
Deixo-os assim ao gelo, redondos e suspensos,
quero oferecer a coroa deste corpo
a um ausente, e até que a dor se desvaneça,
sem ter ninguém para me reter.

( extracto da ultima carta de amor de Inez a Pedro) LM, Paris Abril de 2005

jeudi 14 août 2008














O rapto da memoria


o outono despe a natureza
e vou cumprir o sucedido.
a sincope do rapto
nao me poupa.
levo no dedo o corte
e na agulha a linha.
parto o dente com a pedra,
em cheio no làbio.
limpo com a renda e envolvo tudo nela.
quando eu arder no sulco càvico
da mina, abre entao o segredo
e espreita o esmalte.
hei-de coser as palpebras entre elas
e abdicar do escuro por fora.
fico com a luz que me dou
quando te penso.
mexo-me.
ato as pernas com os atacadores.
estou envolta em silêncio
e o homem jà nao se passeia
mais pelo meio.
este espaço està desertado.
vou-me integrar e sair pela cabeça.
adeus agora.
vejo-me no tecto
e saio pela porta fechada no trinco.
repito adeus sem som, nem maos,
nem asas levantadas contra o vento.
jà nao preciso de empurraozito
para voar.
é so luz amor.
esqueci-me de rezar,
oiço as Parcas a fiarem.
atravesso o desert de Léthé,
recomeço a beber as gotas do rio amélés,
le " sans-souci".
acontecerà um novo viver sem nos dentro.
sinto que nao te vou puder esqueçer,
escreverei isto mais tarde em azul,
apos o primeiro déjà vu.
serà que me vou lembrar?

LM, paço de arcos, julho de 2008

vendredi 8 août 2008

Ser Perséphone

[portrait-vertnoir.jpg]

abro este verso com um estalido.
provo-lhe a semente
e vou engolir o vacuo
esvaziando o mundo.
deixo-me ir pelo ralo
sem limpar à volta
o sedimento gira
e desaparece.
desfio o adesivo
abro a boca à ferida
sinto o cheiro azedo
que exala o sangue.
a cola pinta o rastro
dos pontos, o enigma
da cruz arrepela-me.
pernas para que te quero,
vou sair daqui depressa.
sou o grilo maior que a janela,
a espernear face a uma ingénua
crueldade.
o enigma da infância
desses dias perfurados,
como dedos nos gatilhos
a experimentarem os alvos
atirados ao ar.
Poule!
madrugadas em avanço,
sonhos apocalipticos,
mares levantados
com pontes estreitas,
e os meus pés a escorregarem
sobre no gelo das ondas.
vou cair agora mesmo
e tudo vai recomeçar,
paro com as dores
a pele alisa em estatua
sem po.
afasto a cortina no meio do frio,
desfeio, certa que vou renascer.
o rei absoluto provoca uma
alteraçao e acolhe-me
na concha.
Sou Vénus e arrebata-me
o coxo.
esperneio no fundo da terra
à espera de primaveras,
e a roma abre-se de novo.
posso florescer ao pé da minha
Deméter, usufruir da luz
escapo à chaga e ao fogo,
ao ferro ardente.
tenho quatro maos dentro de mim
a cozerem pao e afiarem o linho.
hei-de esperar o secar
da macela, fazer-te chà para
te acalmar as visceras.
planto beijos nas tuas coxas
quentes.
por instinto caço como um cao
e preparo-te um met
digno das minhas preces
que te acompanham
o sono e me alimentam o corpo.
quero que penses agora
que so o teu falar me arranca
do coraçao a tristeza.
quero uma melodia grave
e sobressaltada,
oficina bem o teu cantar,
desfia à fenda o sangrar
do meio corpo.
pensador, prova-me o final
deste agravo, limpa o prato com a lingua,
bebe-me e observa-me nos olhos
a distância e o caminho.
abandona-me agora.
foge-me.

LM, 2 agosto, 08.