dimanche 4 septembre 2011

ser Perséphone


abro este verso com um estalido.
provo-lhe a semente
e vou engolir o vacuo
esvaziando o mundo.
deixo-me ir pelo ralo
sem limpar à volta
o sedimento gira
e desaparece.
desfio o adesivo
abro a boca à ferida
sinto o cheiro azedo
que exala o sangue.
a cola pinta o rastro
dos pontos, o enigma
da cruz arrepela-me.
pernas para que te quero,
vou sair daqui depressa.
sou o grilo maior que a janela,
a espernear face a uma ingénua
crueldade.
o enigma da infância
desses dias perfurados,
como dedos nos gatilhos
a experimentarem os alvos
atirados ao ar.
Poule!
madrugadas em avanço,
sonhos apocalipticos,
mares levantados
com pontes estreitas,
e os meus pés a escorregarem
sobre no gelo das ondas.
vou cair agora mesmo
e tudo vai recomeçar,
paro com as dores
a pele alisa em estatua
sem po.
afasto a cortina no meio do frio,
desfeio, certa que vou renascer.
o rei absoluto provoca uma
alteraçao e acolhe-me
na concha.
Sou Vénus e arrebata-me
o coxo.
esperneio no fundo da terra
à espera de primaveras,
e a roma abre-se de novo.
posso florescer ao pé da minha
Deméter, usufruir da luz
escapo à chaga e ao fogo,
ao ferro ardente.
Sacudo e tranço os cabelos,
sabes?
Cubro a cabeça do cavalo,
amasso o pao e caio como o besouro,
de costas.
Recomeço entao o ciclo do nosso renascimento.

LM, 2 agosto, 08

lundi 13 juin 2011

A Barca dos Infernos



A Barca dos infernos

Um drama singular,
uma atroz dilaceração,
um grão de arroz fendido
obliquando a face mínuscula
e opaca do desperdício.

Sobrevivemos juntos,
como um só corpo,
neste quarto de agonizante.
Sacrificio natural de um ser
desviado do sol.

Cresce-nos dentro da alma,
ao de leve,
a pena descaindo da sua asa.

Inclinando a escrita rente à pele
fica escrito pela unha,
a rima juneira e festiva.

Ficamos amplamente desconhecidos,
de olhos esguios como gatos na noite.
Respiramos sem nos vermos,
ignorando o rumo lutuoso da barca.

lm

dimanche 5 juin 2011

de coraçao aberto



De coraçao aberto

Por vezes tudo se esclarece
o corpo ausenta-se,
de maos juntas sinto passar
a palavra redonda que revela
e aquece.

Amiude, engano-me.
Distraida, ausento-me lentamente.

Mordido na sua essência,
o coraçao aberto
desliza fora do meu peito.
Quebro-me.

Refugio amargo acolhe
o meu sangue.
Devolvo a ferida ao carrasco,
de coraçao aberto.

No altar, face ao icone
a imagem impressiona o tempo
que a consome.

O meu coraçao é o que nao sou eu,
fala pela minha boca,
contém desejos,
nao tem queixumes.

Mergulho a mao na noite,
encontro a vertigem que precede o sono.
Escorrego com a aprobaçao de todos.
Nao me pertenço.

Todos me rodeiam.
Tudo vai acontecer longe daqui.
Nao sei onde me levam e vou.

Todos os apelos sao falsos.
LM